quinta-feira, 31 de março de 2016

desistente

   Eu queria, como quase todo mundo quer, poder passar uma borracha na minha vida e começar do zero. Voltar para o útero da minha mãe. Mas isso seria apenas uma questão de atrasar o inevitável, porque a minha vida é uma zona, e eu sou culpada, sim, mas também tem a influência de tantas pessoas, que as coisas só seria diferentes se elas não existissem.
   O que tem de errado comigo? Eu sei que já perguntei isso antes, e que não existe ser humano capaz de me dar uma resposta satisfatória. Mas hoje a questão é médica. O que há de errado comigo... na minha cabeça? Por que as coisas não funcionam como deveriam? Onde posso exigir reparação do que está errado? 
   Eu pego impulso e sou arremessada longe, mas ainda distante do fim das coisas. E quando o efeito do impulso passa, eu sinto tudo desacelerando. Eu desacelero, desacelero, e não estou mais correndo, começo a andar, e os passos vão ficando mais arrastados, até que eu tropeço. Engatinho, vendo meu destino ao longe, mas tão longe, que é um mero borrão. Sinto minhas forças se esvaindo até que finalmente me deixo cair de cara no chão e ali permaneço. Todas as coisas perdem o brilho muito rápido. Tudo que eu almejo não é o suficiente para manter meu interesse em continuar.
   Por que eu sou uma pessoa que nunca termina o que começa? Alguns diriam que sou preguiçosa. Não, eles não diriam. Eles dizem. Mas eu tento. Tento tanto, me obrigo, me esforço, me pressiono, e essa pressão esgota minha última gota de vontade.
   Eu queria ser diferente. EU QUERO SER DIFERENTE. Mas eu não consigo.
   
TOP DEZ COISAS QUE EU COMECEI E NÃO TERMINEI
(por ordem de relevância)

1 - FACULDADE DE FOTOGRAFIA (2012)
2 - FACULDADE DE ARTES VISUAIS (2013)
3 - MEU LIVRO (2009)
4 - CURSO DE INGLÊS (2001. 2003. 2007)
5 - CURSO DE ESPANHOL (2007)
6 - CURSO DE HTML (2005)
7 - CURSO DE VIOLÃO (2007)
8 - NATAÇÃO (2000)
9 - BOXE (2014)
10 - AULAS DE DANÇA (2000)

E um dia, quando eu me matar, qual vai ser a surpresa? Eu sempre desisto de tudo.


domingo, 20 de março de 2016

amor


"PRA SEMPRE", 2013
Remexendo minha lata de lembranças, me deparei com uma carta da Giuliane, de 2008, a única que ainda existe — em um rompante que hoje me causa arrependimento, rasguei todas suas cartas, juntei as bijuterias com significado unilateral e joguei tudo por cima do muro do parque ao lado da minha casa. O arrependimento, na verdade, foi imediato, mas o ódio era tão grande que não fiz o que meu coração pediu: ir até o outro lado do muro, recolher todos os pedaços e guardá-los para sempre.
 Se bem que, de acordo com a própria, eu recebia menos cartas do que ela enviava, então é possível que existam algumas perdidas em agências dos Correios. Uma coisa bem cinematográfica: imagina eu receber algumas dessas cartas daqui 50 ou 60 anos! RÁ!
Foi com espanto que encontrei a carta sobrevivente, apesar de eu tê-la colocado na lata conscientemente alguns meses atrás. A peguei, fiquei acariciando o envelope, temerosa do que encontraria dentro. Como se pudesse, magicamente, ter surgido novas palavras que eu já não conhecesse de cor. Tirei as folhas, as cheirei, mas o perfume que antes conseguia sentir já evaporou por completo. Comecei a ler com cautela, mas fui remetida a uma das melhores épocas do nosso relacionamento, quando ela me chamava de "meu amor" e me dava explicações e carinho. Também tive a certeza absoluta de que não me enganei, que realmente falamos em amor além da amizade. Essa foi provavelmente a carta mais explícita que recebi dela. Ela referenciava uma de nossas conversas, me dizia que havia pensado em me propôr namoro, mas ficou com medo de receber um "não" como resposta"... e eu pude me ver novamente na lan house ao lado da escola, a webcam ligada, timidez, ela dizendo o quanto me amava e que eu era linda. Foi naquele mesmo lugar que eu recebi a mensagem responsável por partir meu coração de forma irreparável: quando ela  abruptamente colocou um ponto final no que tínhamos, no que ainda não havia nem começado de verdade.
Lendo a carta senti meu peito apertar, um nó na garganta e a tristeza por todas as coisas que não aconteceram. E pude rastrear tantas coisas para aquela época da minha vida. Nunca mais fui capaz de me envolver daquela forma com ninguém. Nunca mais senti essa conexão. Nunca mais fui capaz de me entregar para pessoas reais, e caí nas garras de pessoas aproveitadoras, de uma forma ou de outra.
Agora mesmo, enquanto digito, sinto meu rosto pegando fogo e as lágrimas surgem, mas ficam retidas.
Eu queria amar novamente daquela forma. Com aquela pureza, inocência, entrega total e correspondência. Independente de como as coisas aconteceram, eu nunca me senti tão bem, nem antes e nem depois. A vida teve sentido e expectativa por um período de tempo. A minha poesia já não falava de tristeza e morte, existia com o propósito único de exaltar todas as coisas maravilhosas que ela me fazia sentir, todas as coisas maravilhosas que ela era.
Mas quando olho para aquela época não consigo deixar de me sentir como se estivesse assistindo através dos olhos de outra pessoa. E obviamente, isso se deve ao fato de que eu SOU outra pessoa, assim como ela não é a mesma. Porra, ela nem ao menos se lembra de um terço dessas coisas! Ou prefere não lembrar?
Mas há ali os mesmos traços que ela até hoje carrega. Talvez eu tenha mudado mais do que ela no fim das contas. Perdi todo resquício de doçura, de gentileza, de esperança, e me tornei em um ser humano caótico. Eu sempre fui uma confusão, mas antes tinha bondade em mim. Ela trouxe essa bondade à tona, mas também a matou de vez.
Nessa carta ela dizia que sabia que estava me ferindo e se propunha a parar de fazer aquilo. Naquela época ela estava namorando um garoto para manter as aparências, mas deixa isso totalmente escancarado para mim. Inclusive diz com todas as letras que me amava desde antes, quando estava estava noiva de outro, e que o cara soube disso mesmo antes de ela saber. Ela dizia que era só eu pedir que ela terminaria com o novo namorado. E eu lembrei que na época isso era tudo que eu mais queria na vida, mas não me sentia no direito de dizer a ela o que fazer, sobretudo porque eu não podia lhe oferecer nada do que precisava, a um estado de distância.
O que teria acontecido se eu tivesse pedido que terminasse? Se eu tivesse dado um jeito de ir lá? Isso teria mudado alguma coisa? Nosso amor teria tido uma vida um pouco mais longa?
Apesar da dor, foi bom ter essa certeza... de que ela me amou, e que eu a amei. Não é o suficiente, mas é alguma coisa. Porém também cheguei a conclusão de que nunca vou ser capaz de amar novamente. Não daquela forma — que é a única que consigo conceber como verdadeira. Jamais haverá uma pessoa como a Giuliane, a minha Giuliane, que morreu e foi enterrada pelos princípios da sociedade.
Ela foi capaz de esquecer a Cíntia, que também foi cimentada há muito tempo. Ela seguiu em frente, e agora tem outra pessoa com quem planejar o futuro. Alguém que possivelmente ama ainda mais do que amou a mim. 
Se você conseguiu ler até o final: não lhe desejo mal.


Eu só queria ser capaz de seguir em frente também.




sábado, 19 de março de 2016

mãe... pai... etc

    Eu, como tantos outros nesse mundão de filho da puta, fui criada para achar que tem algo errado comigo. Não existe nada, repito, nada com maior capacidade de foder o mundo do que pai e mãe. Os meus me foderam, e eu fodi tantas coisas em consequência, que o mundo é um pouco pior do que seria se eu não existisse. E por isso, com o coração sangrando, declaro aqui e não voltarei atrás: não vou ter filhos.
    Eu tento, tento, tento, tanto ser diferente dos meus pais, mas o tempo todo me pego sendo uma cópia deles. Ainda não tão dura, mas dizem que a prática leva a perfeição. E eu não quero ser meus pais. 
   Algumas pessoas simplesmente não nasceram para ter filhos, e infelizmente sou uma dessas pessoas, porque estou presa para sempre no ciclo de confusão e ódio da minha família. E nisso não me refiro exclusivamente aos meus pais: minha família no geral, até onde consegui rastrear, é completamente surtada e sádica. Meus avós e meus tios também fazem parte do pacote da fodeção mental que foi a minha existência até agora. Desde o simples descaso, ser sempre a preterida, até ser trancada no porão, aterrorizada psicologicamente, levar surras constantes, ser impedida de usar o banheiro (trancado a chave) e uma longa lista de etc. A desculpa deles: "meus pais foram piores comigo".

  Tanto meu pai quanto minha mãe têm doutorado na arte da manipulação. Eles chantageiam, torturam, mentem, e ainda nos fazem sentir como os inadequados. Isso sem deixar grandes marcas físicas, sem evidências de tais abusos, e sem possibilidades de reclamar, porque existem pais piores. Existem os que abandonam os filhos numa lixeira e nunca mais olham para trás. Diante disso meu caso fica muito fraco, o júri inocenta meus pais.
"Eu sou inteligente, você é burra
Eu sou grande, você é pequena
Eu estou certo, você está errada"
   O que é um pai que não vai à sua formatura do ensino fundamental, que não aparece no lançamento do seu livro, que te pressiona para pegar empréstimos bancários e suja seu nome, que grita que você é uma idiota, que não agradece por você trabalhar quase de graça para ele (...) perto de um pai que te joga no lixo ou um que te passa uma IST durante o ato sexual forçado? De fato, meu pai não me bate há exatamente uma década. De fato, em outros momentos da vida ele encheu meu rabo de dinheiro. Mas na minha casa não há abraços, não há palavras de incentivo, não há preocupação além daquilo que não o beneficia.
Eu tinha 10 anos. O Junior 9, e o Felipe 7.
   



Minha mãe era do tipo que mandava cartinhas em momentos de ódio, mesmo que você estivesse morando com ela. E ela esquece tudo que não lhe interessa lembrar, como o real motivo de ter me expulsado de casa quando eu tinha nove anos (meses antes da carta ao lado). Ela não acredita quando digo que seu irmão abusou sexualmente de mim por anos, começando quando eu tinha seis. E, como qualquer pessoa que me conhece sabe, ela costumava usar a mim e aos meus irmãos como sacos de pancada para aliviar seu estresse. Mas ao menos ela não me jogou na privada de um banheiro. Ao menos ela não me prostituiu para comprar crack. Referência para o futuro: na carta que segue ela era apenas dois anos mais velha do que eu sou agora. Gosto de pensar que eu não escreveria uma carta dessas para meu filho de 10 anos.
   Meus pais são passáveis.  Como a minha, existem milhares de outras histórias
"Eu me arrependo de ter tido filhos, bjs"
   Outras pessoas gostariam de ao menos ter pais. Não importa se eles fossem doidos varridos, se saíssem na mão no meio de uma avenida e os ônibus, carros e passantes parassem para ver a cena enquanto você e seus irmãos gritavam e choravam desesperadamente. Eles só queriam ter a quem chamar de "mãe", de "pai". E eu sou ingrata. 
   É muito difícil entender que eu sinta inveja de primos, de amigos? Eu sempre vivi à sombra de pessoas felizes. Quando eles me contam que seus pais o apoiaram, em qualquer aspecto que seja, prendo a respiração por uns segundos, tentando conter a tristeza que se manifesta mais na boca do estômago do que no peito. Por que eles podem ter isso, e eu não? Cadê minha foto com meus pais atrás de mim na formatura  que não tive do ensino médio? Por que minha mãe não pode ser minha melhor amiga? Porque eu não tenho com quem contar? Por que meu pai não vai me buscar à noite no ponto de ônibus? Por que eles não se importam? Por quê?!
   Se seus pais morrem, se você é abandonado, você é chamado de "órfão". Mas qual o título que você recebe quando tem pais, eles estão ali, mas não no sentido emocional?
   E agora vem a pior parte: muitos dos meus amigos vivem repetindo que a minha família inteira é um lixo, que só tem filho da puta. E eu concordo (eles não dizem, mas eu sei: também sou uma filha da puta). Eles dizem que eu merecia melhor. Mas — muitos deles — agem como se eu não merecesse, ao me tratar apenas menos pior do que a minha família me trata. Eles também me manipulam, também me chantageiam, também me ignoram. Também me fazem sentir que tem algo errado comigo.
   O que há de errado comigo?

...

sábado, 12 de março de 2016

Com quem eu falo? Pra quem eu escrevo?
Pra mim? Pra ninguém. 

Às vezes penso que a solução para essa necessidade de pôr os pensamentos em palavras, de organizar essa bagunça, seja comprar um diário de papel. Antes me bastava. Mas aí penso no cansaço, na mão doendo, na morte da árvore. Minha vida é uma repetição sem fim. Eu fico irritada. Eu me sinto desvalorizada. Eu amo, eu odeio, eu me fodo. E dói.

quinta-feira, 10 de março de 2016

registro

Quando a pessoa te conhece, te conhece.


Ele: 
quase perguntei se você está bem 
Eu: 
e por que não perguntou? haha 
Ele: 
você nunca está bem 
Eu: 
eu nunca ESTAVA bem. 
Ele: 
(...) e se dissesse que está agora, não adiantaria muito 
Eu: 
por que não? 
Ele: 
porque eu não acreditaria 
Eu: 
e se houvessem circunstâncias? 
Ele:
sempre há 
deixe-me ver o seu perfil no facebook 
"os seres humanos me assombram" 
é você mesma xD

cerol

Para muitas pessoas
não basta empinar pipa
Elas precisam cortar
a linha dos outros.

Por isso o mundo é o que é.