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Primeiro dia de aula. Primeiro dia longe de casa - com pessoas desconhecidas, adultos e crianças. É tudo assustador, mas as possibilidades são infinitas. Você tira uma soneca.
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Você anseia ser a primeira da fila, para que a professora te segure pela mão. Mas você não é a mais baixa da turma.
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Na sexta-feira você pode levar um brinquedo, pode se agarrar a ele e fingir que nada daquilo é real. E de certa forma, nada daquilo é real.
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Você tem mais peito do que as outras crianças. As tias da merenda escancaram esse fato e riem da sua timidez.
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Você gira a corrente, talvez 18 quilates, que ganhou do seu pai. Gira, gira, gira - ela voa para um telhado, longe do seu alcance. (Sua mãe vai te matar.) Os anos passarão e você continuará lamentando a perda da corrente.
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Ela é mais velha, ela é repetente, ela rouba seu leite e te bate. Todos os dias.
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Mas você nem gosta de leite.
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Sua mãe deixou sua roupa sobre a cama antes de ir trabalhar. Geralmente você não tem direito de escolha, mas dessa vez, olha só, ela escolheu justamente o seu conjunto preferido. Short laranja e camiseta com estampa de girafa. 20 anos afrente, você encontrará, com espanto, estas duas peças de roupa tão queridas, no brechó que ela vai abrir - à venda por 1 real; mas ela não vai te vender.
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Você está na casa da sua melhor amiga, S-a-r-a, fazendo miojo. É estranho pensar, mas vocês erram a receita. O tempero fica embolado no meio do miojo e todo o resto não tem sabor nenhum. Lembra que ela te disse, ao mexer, que deveriam rebolar? Mas você não rebolou.
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(Eu tenho uma amiga cuja filha tem dor de barriga sempre que fica ansiosa ou nervosa ou triste. Ela diz para a filha: "se você não aprender a se controlar, vai passar a vida no banheiro".)
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A professora te manda entregar um bilhete em casa: ele diz que você não é tão inteligente quanto as outras crianças; ou, bem, quer dizer isso. Chegando em casa, você vai ao banheiro, chorando por antecipação. Sua mãe vai te matar. Você joga o bilhete no lixeiro, no meio de papéis imundos.
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À noite tudo é nefasto e o banheiro fica do lado de fora da casa... ei, aquilo é uma pedra ou uma bruxa? Dizem que os seres humanos são programados para ver rostos em tudo, é uma associação inevitável. E o medo? É inevitável?
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Você leva sua atual melhor amiga, T-h-a-m-i-r-e-s, para o banheiro antes da apresentação de dança da escola. Você tenta induzi-la a dançar sensualmente, juntas, assim, tirando a roupa. Você tira a roupa, mas ela não tira. Você se tortura sobre isso para sempre.
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Sua calcinha preta está suja.
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Você tenta se esconder no banheiro, mas não tem jeito. Ela vai te bater.
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Você come a merenda escondida no banheiro - porque tem vergonha que te vejam comendo.
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Você entra no banheiro masculino para bater naquele menino que vive te empurrando porque você é g-o-r-d-a. Ele nunca achou que você entraria.
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Ele prefere sua amiga.
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Ajoelhada na frente da privada, você mete o dedo na goela.
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Você entra no banheiro para se cortar com a lâmina de barbear do seu pai.
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Você está quase tendo uma overdose no banheiro!
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Você nunca será, para eles, o que eles são para você.
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No banheiro, você se olha no espelho, e nada parece real, nem seus poros.
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Você ouve um clique, e pensa: onde eu estive nas últimas duas horas? Você não lembra.
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Clique.
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A vida passa num instante.
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Mas
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VOCÊ
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passou a vida toda desejando que ela parasse.
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A vida
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É um
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Clique.
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E quando você vê, a mulher que você ama está pronta para se casar.
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E você não será convidada para a cerimônia.
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